terça-feira, 30 de setembro de 2008

CHEIDE



Quando eu cheguei ao Bar do Frank, ele já estava na porta, do lado de fora, todo displicente como quem não quer nada. É claro que estranhei. Já tinha visto até mendigo no bar, mas...
Entrei, cumprimentei o pessoal, pedi uma cerveja, a de sempre, e aguardei o show começar. A banda do dia era Os Credenciados, banda cover dos Creedence Clearwater Revival, grupo americano de rock e country, que fez muito sucesso nos anos 70. Indagando aos amigos, soube que seu nome era Cheide. Pelo menos era assim que o chamavam no bairro. Fazia pouco tempo que ele aparecera por lá. Não era um mendigo, isso não. Sua aparência revelava que vinha de uma boa família. Tinha bom trato. Ar imponente, não de um nobre; estava mais para um playboy, adolescente jovial e de boa família. Apareceu no bairro, ninguém sabe de onde. Começou a freqüentar a farmácia, o açougue, até mesmo o cabeleireiro, mas ninguém lhe dava atenção; achavam-no um João-ninguém, um rejeitado. Por fim, parou no bar do Frank. O cozinheiro, penalizado, acabou oferecendo a ele as sobras do almoço. Cheide comeu avidamente e desde então não saiu mais do bar.
Estava eu aguardando a banda começar e Cheide continuava inerte à porta do bar, alheio a tudo, quando o solista dos Credenciados puxou o primeiro acorde, um som de arrepiar, Cheide deu um pulo. Como se costuma dizer: pulou nas tamancas. Um pulo que chamou a atenção de muitos, inclusive a minha. Pulou pra dentro do bar, se posicionou diante da banda e vorazmente, a cada dedilhado do solista na sua guitarra, Cheide emitia um sonoro latido. Isso mesmo, latido. Ainda não tinha lhe dito? Não? Sim! Cheide era um cachorro. Não sei precisar a raça. Lembrava-me um collie com os pelos mais curtos. Vira - lata, talvez. Certamente.
Cheide levantava as orelhas e latia ao ritmo da guitarra. Alguém tentou puxá-lo para fora; Ele, com muito custo, atendeu. Mas quando o guitarrista começou a fazer um eslide, Cheide não resistiu, voltou pra dentro do bar e começou a latir novamente, agora mais cadenciado, acompanhando o som da guitarra. Achei aquilo demais, saí para indagar mais sobre ele. E descobri que recebera esse nome do segurança do bar, por que para ele, aquele cão era cheio de fome, cheio de pulga, cheio de sede, cheio de tesão. Um dos fregueses do bar, que eu não fiquei sabendo o nome, também simpatizou com o Cheide. Por ironia, esse cliente não possuía, na sua mão esquerda, o dedo polegar. Ele mesmo, sem eu perguntar nada, me disse que havia perdido o dedo para um Pit Bull. Um cachorro que seus filhos haviam ganhado por ocasião da morte de um tio, seu irmão. Sua mãe, que ficara numa tremenda depressão, simpatizou com o cão, o Pit Bull, e melhorou consideravelmente. Por isso ele havia deixado os filhos ficarem com o cachorro. Só que anos depois, como todo bom Pitt Bull, o cachorro o estranhou e o mordeu. Só largando quando o seu dedo polegar ficou dentro da boca do cão. Esse cliente ficou apaixonado pelos dotes musicais de Cheide e resolveu adotá-lo. Ele era muito ligado a música, possuía até uma comunidade no Orkut chamada Planet Metal Rock Club.
Quando o show terminou, Cheide foi levado para dentro do carro do tal cliente. A princípio relutou um pouco, mas depois, percebendo que o cara era do bem, entrou no carro e se acomodou no banco do carona. O cliente, como percebeu que eu também simpatizara com o Cheide, veio se despedir de mim e me notificar que os filhos dele vieram buscá-lo, estavam levando o Cheide para casa e já tinham mudado o nome dele para Ozzy. Muito sugestivo esse nome, você não acha?
Procurei no Orkut a comunidade do novo dono do Cheide, melhor, do Ozzy, Planet Metal Rock Club. Achei, entrei e adicionei o cara. Perguntando pelo Ozzy, soube que ele se enturmou legal com a nova família, já tem até uma página no Orkut e seus dias como Cheide ficaram no passado. Ozzy, esse é seu nome.DOE FAZ BEM A ALMA.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008


Jogo de Encontros