domingo, 28 de fevereiro de 2010


O ALMOÇO

Meio dia, o calor fervente anunciava um verão que ainda não chegara.
Um apito de fábrica lembrou-me o estômago vazio.
Deitado em minha cama pensava na televisão, que insistia em falar comigo. Um estrondo fez mexer objetos do meu quarto que há muito ali estavam. Aquele estrondo ocupou todo o espaço. Corri pra janela e vi. Um cogumelo suspenso no ar fez-me lembrar Hiroxima e Nagasáqui. Senti as pobres vítimas do orgulho, da ambição, da insensatez. Saí à rua. Pedaços de corpos ornavam a calçada. Um braço estendido, mão aberta num breve aceno. Uma perna perdera o seu corpo. Alguém jazia espremida contra a parede que destruíra para sempre um sorriso. Ruínas denunciavam outrora um lar.
Aproximei-me. O sangue, tingindo o chão, escorria em direção dos meus pés.
Ouvi, ao longe, vozes indagando: “O que foi?” “O que houve?” “O que aconteceu?”
Gritos e choros começaram a chegar. Alguém, entre soluços, desculpava-se: “Fabricavam fogos de artifícios para festas, para festejar...”
Helicóptero, bombeiro, polícia, vizinhança, “reclamavam” a rua. O cheiro de gente sobrepujava o de carne queimada.
Voltei a casa, peguei minha assustada camisa em cima do sofá.. Saí pelos fundos, deixando para trás a manchete de jornal.
O apito da fábrica ressoou novamente. Pensei: “O que mamãe fará para o jantar?”

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